STJ anula confissão de mulher acusada de matar marido após perita dizer em podcast que forçou depoimento da ré
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Publicado em 10/09/2024

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) declarou nula a confissão dada por uma mulher acusada de matar o marido após uma das peritas que atuou no caso dizer, durante participação em um podcast, que forçou a declaração da ré.

De acordo com os autos, em 2018, a suspeita Adriana Pereira Siqueira, desconfiada de suposta traição conjugal, matou o companheiro a facadas e ateou fogo ao corpo. Ela foi presa em flagrante no dia seguinte ao crime após confessar o assassinato à equipe da Polícia Civil.

Em março de 2022, a fotógrafa técnico-pericial Telma Rocha e o perito criminal Leandro Lopes, que atuaram da investigação do crime, participaram do podcast Inteligência Ltda. e comentaram alguns detalhes do caso, o que motivou a decisão do STJ.

Telma disse que, quando estava na cena do crime, ao conversar com a suspeita, percebeu que a mulher estava com a unha e calça sujas com o que parecia ser sangue (confira as falas abaixo).


 Eu falei: 'Olha, deixa eu te falar uma coisa, eu vou conversar com você bem devagar, você não me responde enquanto eu estiver falando, você vai pensando na resposta'. E aí o doutor sinalizou como quem está dizendo 'Vai embora'.

 'Eu vi que tem sangue embaixo da sua unha'. Ela falou: 'Mas eu estou menstruada'. Eu falei 'Não precisa me responder, mas não esqueça que você está falando com uma mulher, porque eu também menstruo''.

 Fui enrolando ela um pouco, falando que às vezes a gente quer tomar uma atitude, mas, no calor da emoção, a gente toma outra atitude e isso não está previsto, que ela não ia sair de lá esculachada, algemada ou no camburão da viatura.

 E ela: 'Não fui eu, não fui eu'. Eu falei: 'Calma, deixa eu acabar de falar'.

— E aí a gente deu mais uma forçadinha. [...] Eu falei: 'Só que você confessar agora para a autoridade policial vai te trazer um benefício'.

— E aí ela falou: 'Fui eu'. Naquela hora que a pessoa fala 'fui eu'... Dentro de você aparecem dois pom-pons falando: 'Uh, caralho!'

Decisão do STJ

Após a veiculação do podcast, a defesa de Adriana impetrou um habeas corpus solicitando a anulação do processo por violação de direito do silêncio, mas a Justiça não acatou o pedido.

No entanto, a ministra da 5ª turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Daniela Teixeira acatou em parte o instrumento processual:

"É possível ver e ouvir o relato da Sra. Telma, que detalha como convenceu a paciente a confessar o crime, sem informar de seu direito ao silêncio, bem como a busca e apreensão realizada na casa da paciente logo após a conversa", apontou a ministra.

"O print também nos permite concluir pela identidade dos peritos Telma Rocha e Leandro Lopes, alocados no Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa de São Paulo. [...] A paciente não foi advertida de seu direito ao silêncio e ainda foi pressionada a confessar a prática delitiva, na contramão do princípio do devido processo legal e o direito ao silêncio de todo acusado", destacou a magistrada.

"Desse modo, verifico a nulidade da confissão extrajudicial da acusada e a busca domiciliar realizada na casa da paciente, uma vez que ela foi concedida sem o conhecimento de seus direitos e sem voluntariedade, de modo que declaro ilícitas tais provas", justificou.

A ministra afirmou, ainda, que a conduta dos peritos é "extremamente censurável por expor um caso que não foi julgado nos meios de comunicação, utilizando palavreado inadequado, em ambiente com bebida alcoólica e violando o dever de impessoalidade que se exige dos servidores públicos".

Por fim, ela determinou que os órgãos competentes apurem a conduta funcional de Telma e Leandro.

g1 questionou o governo de São Paulo acerca da conduta dos policiais. Em nota, a Secretaria da Segurança Pública (SSP) disse que os agentes são investigados por meio de procedimento administrativo instaurado pela Corregedoria, que tramita sob sigilo, de acordo com a Lei Orgânica da instituição.

Status do caso

Apesar de o STJ ter declarado a confissão nula, além dos laudos produzidos pela busca domiciliar e outras provas que o juiz de primeiro grau entender proveniente ou derivadas, o órgão manteve a decisão de pronúncia em face da acusada, ou seja, levar a causa a julgamento pelo júri popular. Isso porque ela também prestou depoimento em juízo, seguindo os ritos legais.

Após a prisão em flagrante da acusada em 2018, a Justiça publicou sentença de pronúncia em 2019 e concedeu liberdade provisória à mulher. Agora, ela aguarda o júri popular, que tem data prevista para 30 de janeiro de 2025.

Na última sexta-feira (6), a 3ª Vara do Júri da Capital afirmou que não há de se falar em reconsideração da decisão que recebeu a denúncia e que as partes devem aguardar a data do júri.

Diante da decisão do STJ, a juíza determinou a retirada do interrogatório extrajudicial da acusada, o laudo da residência e o laudo de material genético que analisou amostras coletadas na residência da vítima. Além disso, a magistrada Isabel Rodriguez oficiou o Instituto de Criminalística para que encaminhe novo laudo do local dos fatos.

 

 

 

 

FONTE: G1

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